Recanto Literário

Qual o proveito das flores postas somente sobre o caixão? Têm mais valor as que são dadas em vida.

Textos


Agarra a moça, doutor!

 

Sou, por via materna, descendente de cearenses. Não sei ao certo, mas meus bisavós ou meus tetravós eram cearenses. Creio mesmo que eram os bisavós, pais do meu avô materno, José Monteiro da Silva, que era piauiense. Aproveito a deixa para dizer a quem não sabe que a forma tataravô (e, evidentemente, as suas flexões), como sinônimo de tetravô, é popular. Assim, muitos eruditos não a aceitam, como era o caso do gramático Napoleão Mendes de Almeida, meu professor de português por algum tempo. A palavra, contudo, está registrada no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras. Isso basta. Com todo o respeito ao meu professor, pode ser usada.

 

Pois bem, quem me lê há algum tempo sabe que sou apaixonado pelo linguajar nordestino. Não me cansa dizer que sou filho de pai piauiense, do Canto do Buriti, e de mãe maranhense, do interior de Pedreiras. Assim, embora já não empregue corriqueiramente muitas palavras comuns desse lindo e rico linguajar, eu as conheço e as admiro, razão por que de vez em quando volto ao assunto. Acho muito bonito, por exemplo, o emprego de verbos como agarrar, embiocar, rebolar, e assim por diante. Em criança, ouvi muito frases como esta: “Ele chegou e, sem cerimônia, já embiocou de porta adentro.”

 

Foi assim que, embora a linguagem da capital seja bem diferente da do interior, ficava embevecido a ouvir as pessoas em Fortaleza, capital do Ceará, na viagem que fiz em fevereiro deste ano. Cheguei mesmo a comentar dentro do taxi, por exemplo, o emprego deste ou daquele verbo e dizer que escreveria uma crônica. Amo essas coisas da língua! Infelizmente, não anotei tantos verbos e outras palavras que poderia relembrar aqui. Irei me lembrar, de vez em quando, porém, e prometo escrever. É o que faço agora com a frase, ouvida de uma fotógrafa, logo ao chegar à praia de Canoa Quebrada: “Agarra a moça, doutor!” Aliás, existe a forma retratista. Isso, contudo, fica para outra crônica.

 

Chegamos a Canoa Quebrada no dia 6 de fevereiro de 2025, por volta das 10 ou 11 horas de um dia lindamente ensolarado, onde ficamos até as 17 horas, quando seguimos para Fortaleza. Foi muito agradável, bom até dizer chega. Um dia muito lindo, de muito sol, à beira do oceano. Comida boa, pessoas lindas e alegres. Passeio de bugue e muitas outras atrações. Por amor à língua, lembro que a forma inglesa é buggy, mas a forma aportuguesada bugue, conquanto ainda não esteja registrada no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, está no Novíssimo Aulete Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguesa. E bugueiro é o motorista de bugue.

 

Pois, sim, caros leitores! Foi lá em Canoa Quebrada que, logo no início do passeio, uma fotógrafa, quando a Câmelha e eu, como marido e mulher, fomos tirar uma foto para registro, usou lindamente (eu pelo menos achei) o verbo agarrar. Primeiro, ela foi lá, nos posicionou e explicou: “Fiquem assim e assim, olhem para ali. Aí o doutor agarra a moça.” Devidamente posicionados e fazendo pose, como eu demorasse um pouco a abraçar a Câmelha para a foto, a fotógrafa gritou: “Agarra a moça, doutor!” Achei o máximo e sorri discretamente. E, claro, agarrei a moça.  

Valdinar Monteiro de Souza
Enviado por Valdinar Monteiro de Souza em 04/04/2025
Alterado em 04/04/2025


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