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Samuel: primeiro dia na escola

Hoje, 1.º de agosto de 2007, o Samuel, meu filho de 2 anos, 3 meses e dias, nascido em 21 de abril de 2005, foi à escola. Foi comovente para mim vê-lo a andar alegremente pela Rua Maranhão, com a Girlene, nossa secretária do lar, rumo à escolinha da Igreja Evangélica Luterana do Brasil, na sua alegria ingênua de criança, sem saber aonde ia.

 

O Samuel é prova viva de que Deus é misericordioso e opera milagres. Ele tinha comunicação interatrial (C.I.A., como chamam os cardiologistas) e nós não sabíamos. Nem os médicos, obviamente. Por causa disso sofreu miocardite logo na primeira vez em que ficou gripado ou resfriado: o vírus desceu para o coraçãozinho, que quase parou de uma vez por todas. Apenas 18% do ventrículo esquerdo funcionava quando se fez o ecocardiograma, ainda em Marabá, dia 7 de julho de 2005, por volta das 13 horas. Tivemos de levá-lo de avião para Belém, com apenas 2 meses e alguns dias de idade.

 

Incerteza, muita dor e muito medo. Angústia no mais alto sentido da palavra, ante a realidade da pequenez do ser humano e o inarredável e desesperador sentimento de impotência. Os médicos pensavam que ele não sobreviveria e, muito embora, não o dissessem com palavras, eram traídos pelo semblante, que os denunciava, fazendo transparecer para mim o que nos queriam ocultar.

 

Tive, graças a Deus, apoio dos vereadores da Câmara Municipal de Marabá, notadamente do primeiro secretário da Mesa Diretora, vereador Leodato da Conceição Marques, e do prefeito municipal, vereador Maurino Magalhães de Lima, que assumira a Prefeitura ante a cassação do registro de candidatura do prefeito eleito, Sebastião Miranda Filho, e que autorizou, sem demora, o frete do avião.  A eles a minha profunda gratidão, sempre. Também ao Reinaldo, motorista da Casa, que esteve comigo o tempo inteiro até o embarque no avião e foi de uma dedicação a toda prova. Não tenho, honestamente falando, palavras para expressar minha gratidão a eles.

 

Já em Belém, o bebê foi internado no Hospital de Clínicas “Gaspar Vianna” (HCGV), sobreviveu e veio a se recuperar plenamente depois. Não ficou com seqüela. Minha gratidão a todos os médicos e servidores de lá, muito embora eles nem se lembrem disso. Gratidão à doutora Carmosina Lobato, que o assistiu como médica, em Marabá. Também à Sheila Maria, amiga e ex-colega de trabalho na Universidade Federal do Pará, campus de Marabá, pela acolhida hospitaleira no mais alto sentido da palavra.

 

Os dias que se seguiram foram terríveis, carregados de angústia pela incerteza, que arrasa, que mata. Sentia como se todo o peso do mundo estivesse sobre mim ao longo daqueles dias, mormente quando despertava pela manhã, inteiramente deprimido. Foram dias de muito medo, de angústia e de incerteza ante a crueza das limitações e da impotência humana. A impotência e as limitações humanas tão cruamente verbalizadas na expressão: “O que humanamente se puder fazer será feito.”

 

Chorei muito ao longo dos primeiros dias. Quase não conseguia conversar sem chorar, porque tinha permanentemente um nó na garganta: pensava que o bebê morreria, que jamais teria a alegria de vê-lo crescer, de passear com ele, de vê-lo ir à escola. Não conseguia pensar em outro assunto e sentia-me impotente, como via impotentes todas as pessoas em pé de mim e do meu filho.

 

Um dos dias fiquei sozinho, das 17 às 21 horas, porque a Sheila fora acudir a alguns compromissos inadiáveis, e ali, no ápice da angústia e do medo, encontrei o consolo na leitura da Bíblia, Mateus 5.4: “Bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados.” Era domingo e as pessoas, parentes e amigos, estavam para a igreja em todos os lugares, por isso eu não conseguia interlocutor em lugar algum nem pelo telefone. Depois de muito tempo sozinho, a primeira pessoa com quem consegui conversar foi a Maria José Brito Correia, minha ex-convivente, mãe do meu filho Douglas. Chorei conversando com ela pelo telefone e falando do bebê! Somente mais tarde, bem mais tarde, falei com o Douglas e com o reverendo Ismael Clóvis, pastor e irmão amigo, da Igreja Presbiteriana de Jacundá.

 

Hoje, não. Hoje é dia de felicidade e de indizível gratidão a todos pelo que fizeram e a Deus pela existência deles. A gratidão é a mais nobre das virtudes, como o ingrato é o mais abjeto dos homens. É o que escreveu o cronista Divaldo Suruagy. Também A Bíblia Sagrada ensina a agradecer as bênçãos recebidas e a se alegrar na presença do Senhor.

Valdinar Monteiro de Souza
Enviado por Valdinar Monteiro de Souza em 08/09/2023
Alterado em 10/09/2023


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