Recanto Literário

Qual o proveito das flores postas somente sobre o caixão? Têm mais valor as que são dadas em vida.

Textos

Companheiros de infucas

 

 

“É bom ser amigo de alguém e ter a satisfação de ser reconhecido como tal”, escreveu o cronista maçom Innocêncio de Jesus Viégas. A locução “companheiro de infucas” leva-me à infância, no meio da parentela, em São Domingos do Araguaia, minha cidade natal. Minha mãe e meu avô materno, nordestinos da gema, a empregavam elegante e frequentemente. Companheiro de infucas, na acepção que usavam, é o companheiro de travessuras, de brincadeiras, de empreendimentos diversos. Aliás, acepção correta. O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa a registra, dando a “infuca”, dentre outros significados, o de “execução de um projeto ou de uma ideia”.

 

Aqui, pois, à minha maneira e com mais uma das minhas insignificâncias literárias, quero prestar algumas homenagens, até porque penso que um dos maiores legados que poderemos deixar à posteridade é o registro de momentos felizes, de situações aparentemente simples, dos pequenos assuntos da alma. Com efeito, a minha homenagem, na pessoa de minha saudosa mãe, às mulheres e ao povo nordestino. Filho de pai piauiense e mãe maranhense, sou, com muita honra, um nordestino que, a duras penas, nasceu e se criou no Norte, a saber, no Pará.

 

Pois bem. Ao recorrer propositadamente à expressão “os pequenos assuntos da alma”, rendo minha homenagem a linda cronista e romancista cearense Ana Miranda, uma verdadeira musa, pessoa por quem, apesar de não a conhecer pessoalmente, nutro profunda admiração desde os meus tempos de leitura da hoje extinta revista Caros Amigos. E esta homenagem é tripla. Sim, porque Ana Miranda é mulher, porque “os pequenos assuntos da alma” é uma expressão que aprendi com ela e porque, além disso, é ela nordestina.

 

Outros homenageados com a citação expressa são meus irmãos de ideal maçônico Pascoal de Oliveira e Valby Ferreira Camargo, os companheiros de infucas, razão do título. Valby e Pascoal são irmãos por quem tenho verdadeira amizade, admiração e profundo respeito. Somos companheiros de infucas – como diria minha mãe –, infucas maçônicas, nas quais, quase sempre, estamos juntos. Aliás, não poderia deixar de registrar, também estão sempre ativamente presentes os irmãos Raimundo Souza Cruz Filho e José Soares da Silva. Para mim, se falta algum deles, a infuca fica meio sem graça.

 

No dia 23 de abril, nossa mais recente infuca, foi digno de registro o improviso de um saca-rolhas, idealizado pelo Pascoal e viabilizado pelo Valby, que, já alta noite e longe de casa, ainda não sei como nem de onde, sacou uma chave de fendas, um parafuso grande e um alicate, quando eu já quase desistira de tomar o vinho, por me parecer totalmente impossível. Tomar como? O estabelecimento, uma conveniência da Cidade Nova, não tinha vinho com tampa de rosca (screw cap), só tampa de cortiça, e não tinha saca-rolhas. Foi quando o Pascoal, petrechos à mão, sacou rapidamente a rolha da garrafa. Alegria geral. Tomamos logo duas garrafas! “É mais uma história engraçada para contar”, pensei. E, alegremente, disse a eles.       

Valdinar Monteiro de Souza
Enviado por Valdinar Monteiro de Souza em 14/05/2022
Alterado em 14/05/2022


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