Um passarinho me sacaneou
Omito de propósito a data. Hoje, na hora do meu almoço, um passarinho, não sei se um pardal ou uma pardaloca, sem querer, me sacaneou. Caramba! Logo na hora do almoço? Pois foi. Eram quase 14h30, no portão de casa, e eu comia avidamente o meu almoço. Foi quando o passarinho, como se posicionasse propositadamente sua cloaca indecente rumo ao meu marmitex, despejou-me no peito e no antebraço um bocado de fezes quentes.
Olhei para cima e o vi, sentado, a cantar inocentemente, no fio da rede elétrica, como se nada fizera. Pensei, cá com meus botões, calado, mas quase a verbalizar um impropério daqueles bem cabeludos: “É certamente por essas e outras que alguns indivíduos, às vezes, não agem de forma ecologicamente correta. Ah, se fosse como antigamente, seu safado! Eu, munido de uma baladeira, sem dúvida alguma, você levaria uma pedrada fatal.”
Olhei para o antebraço e para o meu tórax, imediatamente acima do mamilo direito. Lá estavam as fezes, que, para me deixarem mais confuso ainda, eram amarelas, mais líquidas do que sólidas e exatamente da cor da minha comida: arroz, feijão, farofa e carne bovina com pequi. Eu só tinha comido um pouco mais de dois terços da refeição, que estava muito saborosa e fora comprada na porção exata. Por isso, ainda estava com fome e, o que era pior, deixara os pequis para comer por último, pois queria saboreá-los depois que comesse os outros alimentos. Pobre de mim!
Ainda estava com fome, mas tinha dúvida se parte das fezes do passarinho, possivelmente infestadas de salmonelas, tinha caído dentro da comida, embora tivesse quase a certeza de que não caíra. Nojo e medo. Comer aquilo? Não! Além de nauseabundas, como é qualquer outra coisa escatológica ou coprológica, fezes de passarinho, não raramente, causam doenças. Joguei tudo fora, para as galinhas. E, para completar o almoço, fui cozinhar um ovo caipira. Claro, estou ficando é velho, não maluco.
Ah, sim! Por que estava comendo debaixo do poste, em plena rua? Coisas de romântico. A mulher estava saindo para o serviço e, como gosto de ficar ao portão, para vê-la sair, tanto de manhã quanto depois do almoço, embora estivesse sem camisa, com o prato e a colher nas mãos, corri para o portão e, alheio às convenções, fiquei a olhar o carro, que, como das outras vezes, iria se distanciar segundo a segundo e logo desaparecer do meu campo de visão. Na calçada, contudo, fica o poste de energia elétrica – por sinal, muito frequentado por pardais, bem-te-vis e outras criaturinhas. Não deu outra: o passarinho me cagou.
Enviado por Valdinar Monteiro de Souza em 26/10/2021
Alterado em 15/11/2021