Spleen, tédio de tudo
Aprendi, há muitos anos (em 1979, para ser exato), que spleen significa tédio de tudo. Pois bem, consultando o verbete na Wikipédia, vejo, em resumo, que "é um profundo sentimento de desânimo, isolamento, angústia e tédio existencial". Penso, já faz algum tempo, que às vezes sinto isso. Eu fico entediado, angustiado, desanimado.
As razões? Sei lá! Depressão, ansiedade ou coisa que o valha. Por quê? Eu sei lá! Talvez, por causa de algumas enfermidades crônicas ou quase crônicas, mas, seguramente, não é só por causa delas. Não tenho ainda a idade para ficar tão desanimado, mas, de uns tempos para cá, não muito raramente, eu fico. Meu Deus!
Eu tenho ojeriza à corrupção e aos corruptos. Não no sentido da imperfeição humana, pois, nesse sentido, todos nós somos (uns mais, outros menos) corruptos, imperfeitos. Falo de corrupção e de corruptos no sentido mesmo da roubalheira, da improbidade no serviço público, da desgraça que assola o país. Eu tenho ojeriza à corrupção e aos corruptos – bem é verdade –, mas sou obrigado a conviver com ela e com eles.
Eis aí, com certeza, a raiz, se não de todos, de quase todos os meus males. Não tenho dúvida disso. Já não aguento ver o triunfar do desamor ao certo, do menosprezo à correção, a vitória do mal sobre o bem, o bandido que posa de autoridade. E não adianta alguém dizer que tenho que viver a minha vida e fazer a minha parte, porque as imperfeições e desonestidades do outro não são minhas. Isso é filosofia barata. Não adianta, porque, queiramos ou não, elas nos atingem e prejudicam seriamente.
Estou ficando doente, com pesar o reconheço, mas não vejo para quem apelar. Eu sou advogado, conheço o sistema e, conhecendo-o, não posso jamais acreditar nele. Bobo, tolo, maluco, desventurado é quem acredita na justiça. Nos políticos também. Claro que há exceções em ambos os casos, mas exceção é exceção. Basta atentar para o que ocorre no país inteiro, a começar daqui, do nosso arraialzinho medíocre de corruptos e bandidos. Contra fatos não há argumentos. É verdade.
Relembro Isaías, o profeta hebreu que viveu a cerca de 700 anos antes de Cristo, e também o grande jurisconsulto brasileiro Rui Barbosa, os quais sofreram – vê-se – a mesma desventura. Eles o disseram solenemente. Está registrado, para que ninguém o olvide.
Isaías, que clamou dizendo estar perdido por ter lábios impuros e habitar no meio de uma nação de impuros lábios, afirmou com veemência (Is 5.8): "Ai dos que ajuntam casa a casa, reúnem campo a campo, até que não haja mais lugar, e ficam como únicos moradores no meio da terra!"
Rui Barbosa, indignado, cunhou a não menos conhecida declaração de quem já não vê para quem apelar: "De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto."
Já senti, algumas vezes, vergonha de ser honesto.
No momento, estou profundamente entediado. Tenho spleen, tédio de tudo.
Enviado por Valdinar Monteiro de Souza em 09/07/2017
Alterado em 16/11/2021